Chega de fazer gol contra. Se você anda boicotando suas chances de ser feliz, está na hora de driblar esse inimigo interno e mudar o placar. Especialistas ensinam como.
Texto: Iracy Paulina
Quatro anos atrás, Thais Marques do Amaral, 28 anos, trabalhava num banco
As causas
As primeiras pistas são levantadas pela psicóloga Heloisa Fleury, coordenadora geral do Departamento de Psicodrama do Instituto Sedes Sapientiae, em São Paulo. “A questão tem a ver com os recursos que cada pessoa possui para enfrentar as demandas e adversidades da vida”, diz ela. “A mulher com tendência a autossabotagem acredita que não tem condições de lidar com os desafios. Então, acha que é melhor nem tentar porque o tombo certo será muito doloroso”, explica Heloisa. No fundo, resume a psicóloga, esse cenário interno é vivido geralmente como uma função protetora. “Mas é uma falsa impressão de proteção, como se fosse a fala dos pais dizendo para a criança: ‘Você ainda é pequena, cuidado para não se machucar’.”
Segundo a especialista, a autoestima é um pontochave: quem tem luta pelo que quer e também fica mais à vontade para examinar riscos e limitações, certo de que poderá enfrentá-los. Já quem sofre com uma autoestima baixa torna-se presa fácil do medo e da ansiedade quando precisa encarar mudanças ou uma situação sobre a qual não tem controle. Aí, a pessoa sente-se derrotada de antemão e detona o gatilho da sabotagem. Heloisa cita o exemplo de uma mulher casada às voltas com as dificuldades naturais de um relacionamento de longa duração. “A chegada dos filhos, as inevitáveis mudanças corporais, a necessidade de conciliar inúmeras tarefas, tudo isso significava para ela a ameaça de perda do marido”, explica.
O medo a colocava em vigília: ficava mais atenta ao que ele não fazia, a que horas chegava, como se dirigia a ela. Era uma pesquisa de evidências de que ele iria deixá-la”, observa a psicóloga. “Começou a querer controlar tudo, ficou muito exigente, nada a satisfazia. Até que passou a mandar recadinhos para o marido, tentando mantê-lo sob suas rédeas. Por mais que notasse que isso só fazia irritá-lo e afastá-lo ainda mais, ela não conseguia parar. Aos poucos, o parceiro desistiu de conversar e de batalhar para que ela mudasse e o casamento foi se deteriorando”, diz Heloisa.
Para a maioria de nós, é mais fácil compreender o medo de perder o que amamos. Em alguns casos, porém, o que apavora é a possibilidade do sucesso – pois ele simboliza o novo. “De certa forma, o fracasso é uma situação conhecida e mobiliza afetos que reconfortam, como atenção, pena, cuidados”, explica a psicóloga. Já o sucesso é um terreno desconhecido que cobra envolvimento, traz exposição e responsabilidades, representa uma situação que foge ao controle.” E vem à tona o velho cenário interno: “Será que eu seguro essa onda? Melhor nem tentar”. A pessoa dá mais ouvidos à sua criança interior, que precisa de proteção, e perde a oportunidade de examinar objetivamente suas estratégias para enfrentar o desafio. E assim o círculo vicioso da autossabotagem se instala. A origem dessa dificuldade, segundo Heloisa, em geral está na infância. É um padrão construído na relação com os pais ou cuidadores, quando a criança vai formando suas impressões sobre o mundo, sobre si mesma e seus recursos para lidar com o que virá pela frente.Segundo a especialista, a autoestima é um pontochave: quem tem luta pelo que quer e também fica mais à vontade para examinar riscos e limitações, certo de que poderá enfrentá-los. Já quem sofre com uma autoestima baixa torna-se presa fácil do medo e da ansiedade quando precisa encarar mudanças ou uma situação sobre a qual não tem controle. Aí, a pessoa sente-se derrotada de antemão e detona o gatilho da sabotagem. Heloisa cita o exemplo de uma mulher casada às voltas com as dificuldades naturais de um relacionamento de longa duração. “A chegada dos filhos, as inevitáveis mudanças corporais, a necessidade de conciliar inúmeras tarefas, tudo isso significava para ela a ameaça de perda do marido”, explica.
O medo a colocava em vigília: ficava mais atenta ao que ele não fazia, a que horas chegava, como se dirigia a ela. Era uma pesquisa de evidências de que ele iria deixá-la”, observa a psicóloga. “Começou a querer controlar tudo, ficou muito exigente, nada a satisfazia. Até que passou a mandar recadinhos para o marido, tentando mantê-lo sob suas rédeas. Por mais que notasse que isso só fazia irritá-lo e afastá-lo ainda mais, ela não conseguia parar. Aos poucos, o parceiro desistiu de conversar e de batalhar para que ela mudasse e o casamento foi se deteriorando”, diz Heloisa.
Desejo e punição
Para a psicoterapeuta Maura de Albanesi, diretora do Instituto de Terapia Avançada AMO,
Vi que não estava feliz no emprego. Era muita pressão, o banco tinha metas que eu não conseguia cumprir e me sentia incompetente por isso. Também constatei que a filosofia da empresa era contra meus princípios, o que gerava um conflito interno”, lembra Thais. Um mês depois que voltou da licença, foi demitida: “Era a senha para que eu reformulasse minha vida. Hoje trabalho numa empresa de treinamento. Tenho outro cargo, meu salário diminuiu, mas não me arrependo. Aquela crise explicitou minha necessidade de transformação. Nada paga a paz de espírito que tenho hoje”.
Os sintomas
O primeiro passo para enfrentar o círculo vicioso do boicote é se dar conta dos sintomas. A autossabotadora costuma penar com comportamentos bem repetitivos.
Listamos abaixo os mais fáceis de identificar:
• Adia a tomada de providências práticas para superar limitações que percebe em si mesma ou que são apontadas por outras pessoas. Deixa tudo para amanhã.
• É pessimista, não consegue enxergar o lado bom das coisas e contamina as relações.
• Sofre de um conflito interno entre o que deseja fazer e o temor de que não dará certo: “Eu quero muito, mas não consigo”.
• Deixa-se dominar por dúvidas que destroem as chances de tomar iniciativas.
• Não consegue focar e sente dificuldade de estabelecer objetivos e lutar por eles. Ou, então, perde um tempo enorme planejando ações, mas nunca as coloca
• Acelera
As saídas
Além de identificar os sintomas, encarar a autoimagem é uma providência importante, observa a psicanalista Sandra da Luz Inácio, de São Paulo. “A percepção que a pessoa tem de si pode aprisioná-la. Ela aceita esse retrato congelado como um quadro verdadeiro e permanente”, diz a especialista. Nesse contexto, esquecemos que cabe a nós a construção e reconstrução de nossa vida, que ela é um processo. Quando esse fluxo para, essa imagem fixa tende a se expressar com frases prontas. “Aproveite para anotá-las. Elas ampliam a percepção, revelam como você vê a si mesma e a situação – estão ligadas aos comportamentos de autossabotagem”, afirma Sandra.
Outros antídotos contra o problema são apontados pelo educador Luciano Meira, da Franklin Covey, empresa de São Paulo especializada em treinamento para desenvolvimento humano. “Procure avaliar os seus pontos fortes para compensar, pois essa sabotagem funciona como um modo de se autodesvalorizar”, diz ele. Uma forma de fazer essa lição de autoconhecimento é listar as coisas que você já realizou e são motivo de orgulho, demonstram o seu potencial. Luciano aponta também outra estratégia: diante de um desafio, não se coloque um objetivo grandioso. Defina metas menores e vá cumprindo as etapas.” Pequenas vitórias fazem grande efeito. A pessoa pensa: ‘Se consegui vir até aqui, posso ir mais longe’ “, diz Luciano. Esse recurso é indicado para o campo profissional, mas também pode ser adaptado ao pessoal. Trace um caminho realista – e fortaleça-se a cada passo.
Como desativar as próprias armadilhas
No campo da Filosofia Clínica, corrente que usa a metodologia filosófica para tratar problemas existenciais, a autosabotagem é chamada de armadilha conceitual. “Trata-se de uma trama de conceitos que aprisionam a pessoa”, explica o criador da Filosofia Clínica, o filósofo Lúcio Packter, de Porto Alegre. Quem cai nessa teia descreve que tem a impressão de estar numa areia movediça. “No consultório, ao ouvir os relatos dessas pessoas notamos expressões como ‘eu nado, nado, e não saio do lugar’, ‘parece que a minha vida anda em círculos’, ‘quando mais eu busco, menos eu encontro’”, exemplifica.
Segundo ele, há inúmeras formas pelas quais uma trama conceitual pode atrapalhar a vida da gente, criando essa sensação de imobilidade.
O paradoxo é que nem sempre elas são nocivas – às vezes, atuam como proteção, cumprindo funções importantes de organização na estrutura do pensamento da pessoa, afirma Lúcio. “Um homem que tem propensão a sair com várias mulheres pode se recolher, ativando uma “armadilha” que o torna pouco sociável”, exemplifica o filósofo. “Isso vai resultar em certos dissabores mas, por outro lado, garante sua estabilidade familiar com a mulher e os filhos”. Nesse caso, essa atitude foi a forma que conseguiu encontrar para proteger a dinâmica famíliar.
Na abordagem da Filosofia Clínica, o paciente aumenta a consciência sobre suas estruturas de pensamento, descobre como seus conceitos funcionam para ajudar ou atrapalhar sua vida – e assim conseguem superar a sensação de paralisia, revendo seu modo de pensar e agir.
Fonte: Revista Cláudia
'As cores de nossa vida depende de como usamos as tintas, cada um é o seu próprio artista, basta querer mudar o cenário'.